Símbolo cultural, arco e flecha é destaque nos jogos indígenas de São Félix
O que na aldeia é uma ferramenta de caça, na Semana dos Povos Indígenas vira uma das modalidades esportivas mais aguardadas. A competição de arco e flecha levou ao Estádio Municipal Turcão, no centro de São Félix do Xingu, município do sudeste do Pará, um dos símbolos da cultura dessas comunidades. Entre índios jovens, que saem na floresta à procura de comida, aos velhos caciques, que chefiam as aldeias, 15 participaram da competição, exibindo precisão e habilidade. Para eles, mais importante do que competir é poder estar a lado dos irmãos, que vêm de diversas partes do País para o evento.
Um deles é Paulinho Juruna, 33 anos, que saiu do Estado do Mato Grosso e viajou por quase dois dias para participar da semana em São Félix. “Nosso povo veio com muita alegria ao Pará. A gente nunca tinha estado aqui. Temos gratidão com a Prefeitura de São Félix pelo convite. Agora, posso mostrar minha habilidade com o arco e flecha aos parentes Kayapó da região. E, quem sabe, aprender com eles”, disse Paulinho Juruna, acrescentando que “usamos a flecha basicamente para caçar. Mais para a pesca. É como se fosse o anzol de vocês”.
Cada arqueiro teve três oportunidades para acertar o alvo a 20 metros de distância, empunhando arcos feitos nas próprias aldeias. Juízes acompanhavam, atentos, os erros e acertos, fazendo a somatória de pontos que, ao final, apontaria o vencedor. “Para dar uma boa flechada é preciso ter concentração. Passamos anos usando a flecha para caçar. Por isso, aqui quase ninguém erra”, explicou o cacique Rotkaré Kayapó, ao exibir o instrumento que ele mesmo fez, usando madeira e penas de aves.
O vencedor do arco e flecha foi Jakakmãkroro Kayapó, 70 anos, que acertou o alvo no centro, fazendo 100 pontos de uma só vez – marca que nenhum outro índio bateu. Segundo ele, a precisão na mira é resultado da prática de uma vida inteira. “O arco e flecha é uma das nossas maiores tradições, uma das partes mais fortes da nossa cultura, um ícone que nos representa. É uma prática que começa bem cedo, quando a criança ainda é bebê. Aprendemos logo porque é uma questão de sobrevivência. Vivemos daquilo que caçamos na mata”, contou o campeão da prova, que saiu dançando ao final da competição. “É uma dança de agradecimento e orgulho por ser Kayapó”, ressaltou.
Memória - Enquanto os arqueiros tentavam acertar o alvo, os atletas do futebol masculino buscavam o gol. As partidas ocorrem durante todo o dia, reunindo times das 21 aldeias participantes. Na beira do gramado, acompanhado tudo, estava o cinegrafista Clayton Kayapó, sempre em busca de registros memoráveis. Ele faz parte da equipe de 10 índios do coletivo de cineastas Béture Mebêngôkre, de Pernambuco, que faz um trabalho social com as comunidades indígenas da região do Xingu.
“Estamos cobrindo toda a programação para montar o próprio registro e criar uma memória que, depois, será de todos os povos indígenas da região. Nosso objetivo é resgatar a história de nossos antepassados usando a ferramenta do audiovisual”, contou Clayton Kayapó, também interessado em conhecer os equipamentos levados pela equipe de comunicação do Governo do Pará.
Também nesta terça-feira ocorrem, durante todo o dia, jogos de futebol masculino no estádio e futsal feminino, no ginásio municipal.
Os jogos em São Félix são coordenados por técnicos do município em parceria com servidores da Secretaria de Estado de Esporte e Lazer (Seel).