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Projeto Cinema Mudo chega à Vila do Treme, em Bragança

Por Redação - Agência PA (SECOM)
12/02/2015 09h40

Passava das sete horas da noite quando dona Maria Carolina Miranda, de 59 anos, decidiu que iria ao cinema. A sessão inédita seria quase em frente à casa dela, na sede da igreja de São Pedro, na praça central da Vila do Treme. O filme é um clássico do cinema mudo: “O Garoto”, de Charles Chaplin; mas é uma informação que para dona Maria Carolina não faz diferença, o que importa é a experiência da “tela grande”, mesmo que seja um projetor na parede de uma igreja. “Eu só vi filme na televisão, então acho que esse é diferente”, disse antes do filme começar.

Duas horas depois, dona Maria Carolina tinha uma certeza: “É muito bonito. Não sei se entendi direito porque não sabia ler aquelas letras, mas a música eu entendi”, contou, um tanto envergonhada, depois da exibição. Assim como a simples dona de casa bragantina, cerca de 300 outras pessoas também adentraram na história do menino órfão criado por um miserável, em imagens em preto e branco. As risadas e os aplausos ao final da sessão lembraram os primeiros tempos cinematográficos, quando esta mesma película de Chaplin lotava as então luxuosas salas de cinema da América.

Dona Maria Carolina, porém, não se deu conta de que a música que ela entendeu não vinha da tela, mas sim de um piano executado ao vivo pelo maestro Paulo José Campos de Melo, que há mais de 20 anos interpreta ao vivo a trilha sonora dos filmes de Charles Chaplin.

A história começou quando o maestro ainda morava na Alemanha, em 1983, e lá foi convidado a executar a trilha do mesmo “O Garoto”, apresentado na Vila do Treme. “Me entregaram as partituras, mas era impossível tocá-las junto com o filme. Foi quando eu soube que Geraldine Chaplin (filha de Charles Chaplin) estava na plateia e ela me disse que o pai havia cortado mais de duas horas de filmagem para chegar ao final, ou seja, seria impossível tocar de acordo com o original. Perguntei o que faria e ela me disse: improvise”. Desde a conversa, Paulo José segue levando o projeto para vários países, sendo premiado em diversos estados brasileiros e fora do Brasil.

Cinema, música e interiorização

A apresentação no Treme integra hoje o projeto “Cinema Mudo” da Fundação Carlos Gomes, presidida por Paulo José Campos de Melo. Sua exibição na Vila contou com apoio do Instituto Viva Bragança, que atende 200 crianças e adolescentes na cidade de Bragança e localidades próximas da Vila do Treme e Campinho, com cursos de iniciação musical.

Para o pianista, esta é uma forma de mostrar a estes alunos as várias possibilidades no caminho do músico, além de também estar “Cem por cento inserido dentro da cultura de paz, já que a música proporciona outros olhares para quem a vivencia”, acredita.

Além do Projeto “Cinema Mudo”, a noite teve ainda a apresentação de mais de 50 crianças do Instituto Viva Bragança, que apresentaram seus resultados, também acompanhadas por Paulo José Campos de Melo.

Para Rivaldo Miranda, presidente do Instituto Viva Bragança, o projeto “Cinema Mudo” é ainda uma forma de incentivar não apenas estes alunos que estão há mais de um ano participando do projeto de musicalização, mas também quem está assistindo, "pois envolve os familiares e demais moradores dos lugares onde vivem estas crianças”, diz.

Uma prova deste envolvimento ressaltado por ele é a presença de moradores de diversas faixas etárias na sessão de cinema. Aos 71 anos, Maria Emília de Souza foi ao Treme apenas para assistir a neta, Evellyn de Souza, numa apresentação solo de flauta doce; mas saiu do salão paroquial emocionada ainda mais pelo filme que viu. “Eu estou ao mesmo tempo alegre e triste. Fiquei alegre pelo garoto que foi abandonado e teve alguém pra cuidar dele. Mas fico triste por que sei que isso também acontece na vida real. Esse cinema aí só existe por que tem a vida de verdade, né?”.

Mesmo que o viés seja musical, a magia do cinema e seus clássicos filmes mudos continuam. São pessoas como as "donas Marias" da Vila do Treme, que mantêm o encantamento da música e a ilusão do cinema em constante renovação, mesmo  que a tela seja muda e a canção se coloque no lugar mais improvável.