Combate às drogas no Estado recebe olhar social e ações repressivas
Poucos problemas têm um poder de destruição tão forte e abrangente como as drogas. Sejam elas lícitas ou ilícitas. Atento às necessidades de combater um mal que se espalha sem distinguir cor, gênero ou classe social, o governo do Estado, numa união com outros órgãos e entidades da sociedade civil organizada, oferece possibilidades de recuperação para qualquer pessoa que reconheça a necessidade de ajuda na luta contra o vício e suas consequências.
O olhar social que os órgãos de assistência dão ao assunto somam-se às ações de repressão aplicadas pelas forças policiais tanto para quem consome quanto para quem comercializa entorpecentes das mais diferentes origens e composições. Dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup) mostram que 70% dos crimes de homicídios estão relacionados ao uso ou comercialização de drogas, inclusive o álcool. Problemas de ordem social que têm na curiosidade da primeira vez e no comportamento consumista da sociedade moderna as principais origens.
“A falta de uma legislação mais específica, que defina com clareza quem é o traficante e quem é consumidor, dificulta consideravelmente o processo de combate às drogas. Essa definição, quase sempre, fica a cargo do delegado, que usa critérios como quantidade e reincidência para determinar os papéis de cada um no enquadramento”, explica o titular da Segup, Jeanot Jansen. Os bilhões de dólares movimentados anualmente pelo tráfico também são um agravante nas dificuldades para combater o mal. “Quando a coisa envolve dinheiro grande, tudo fica mais difícil”, assinala.
Ainda assim, o Pará já bateu recordes de apreensões em 2015. Só nos quatro primeiros meses do ano, foram 711 quilos de cocaína e 1,6 tonelada de maconha apreendidos. Para se ter noção do avanço, em todo o ano de 2014, as forças policiais apreenderam 626 quilos de cocaína e 1,1 tonelada de maconha. Os esforços são feitos por terra, água e ar, dentro de uma área territorial tanto grande quanto estrategicamente posicionada entre os principais centros produtores e consumidores da América do Sul.
União – A integração é a ferramenta mais eficiente no processo de recuperação para quem procura ajuda. Quando especialistas de diferentes setores e das mais distintas áreas se unem para debater o assunto, a possibilidade de sucesso de programas e metodologias de reinserção social cresce consideravelmente. Por isso mesmo, o Pará fez, durante uma semana inteira, debates coordenados pelo Conselho Estadual de Drogas (Coned) com profissionais de várias partes do Brasil.
Para a coordenadora de rede intersetorial da Secretaria Nacional de Políticas Sobre Álcool e Drogas, Karina Rodrigues Matavelli, a troca de experiências entre programas bem-sucedidos é um dos caminhos mais eficientes para expandir a rede de atendimento e melhorar os resultados entre dependentes que procuram a ajuda do poder público. “O que deu certo em Belém pode dar certo em Aracaju, porque o mal das drogas não respeita limite territorial e, muito menos, classe social”, explicou.
O evento em Belém aproveitou o dia 26 de junho, quando comemora-se o Dia Mundial de Combate às Drogas, para alertar a sociedade sobre os riscos de um mal presente em quase todos os setores da sociedade – inclusive nas escolas. “O problema das drogas precisa ser tratado com um olhar multidisciplinar e diverso. É preciso tratar o usuário como questão social, mas quando esse usuário comete um crime, por consequência da droga, ele passa a ser enquadrado conforme exige a lei. É uma questão complexa, que precisa, sobretudo, do empenho dos pais e da família para ser contida”, analisa o coronel PM Carlos Emílio Ferreira, diretor de Política Comunitária e Direitos Humanos da Polícia Militar.
Atendimento – O Estado está equipado com Centros de Apoios Psicossociais (Caps), por meio da Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa), para acolher dependentes químicos e usuários de drogas com dificuldades para vencer o problema. Um dos desafios, no entanto, ainda é a reincidência desses pacientes, que beira os 80%, segundo a coordenadora do Caps Marambaia, em Belém, Cláudia Garcia. “Se não houver força de vontade e um comprometimento pessoal muito determinado, a reincidência é praticamente certa”, explica.
Um usuário do Caps Marambaia aceitou conversar com a reportagem da Agência Pará. Às 10h30 da manhã, a letargia do entrevistado dá um tom nostálgico e lento à conversa. Ele tem dificuldade de montar as frases e relembrar fatos importantes. Está sem consumir drogas há apenas quatro dias. Começou aos 16 anos de idade. Somente hoje, aos 36, decidiu procurar ajuda. “Perdi tudo. Trabalho, filho, mulher, amigos. Sinto que essa é minha última chance. Se não parar agora, se não conseguir me livrar das drogas dessa vez, com a ajuda que estou recebendo aqui, com certeza o pior vai acontecer comigo lá fora”, reflete.
A coordenadora Cláudia Garcia explica que a maioria dos pacientes vem do interior do Estado. O consumo de drogas, segundo ela, cresceu exageradamente em muitas cidades do Pará. Outro usuário do Caps que deu depoimento é de Igarapé-Açu, no nordeste paraense. Como o histórico do usuário de drogas é sempre muito parecido, ele também precisou perder tudo o que tinha na vida, inclusive a família, para recorrer aos irmãos na busca por ajuda. Depois de doze dias de internação, ele sente-se preparado para encarar o mais difícil no processo de reinserção social: voltar ao convívio de pessoas e lugares que remetem ao entorpecente do qual ele luta para se livrar.
“Minha filha desejou que eu morresse. Meus familiares passaram a ter vergonha de mim. Hoje, agradeço a Deus e ao governo do Estado pela ajuda que recebi aqui. Logo estarei de volta à minha cidade, e tudo o que desejo é recuperar as coisas que perdi. Inclusive minha família. Sei que ainda dá tempo de ser assim. Muitas pessoas conseguem viver sem drogas. Por que eu não posso viver também?”, questiona o homem, cujo sorriso e autoestima refletem o resultado do tratamento recebido.
Recuperação – Retomar o convívio social é o passo mais delicado no processo de recuperação de dependentes. “É comum associar o uso de drogas à criminalidade porque a própria consequência da droga é o ato criminoso, mas é em quem não usa drogas que está a chave para o sucesso do tratamento. É preciso aceitar essas pessoas sem distinção ou discriminação”, explica a coordenadora estadual de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas da Sespa, Marilda Couto. Para isso, todo o tratamento oferecido pelo Estado insere, por meio de visitas e acompanhamentos, outros integrantes da família do dependente, já que o problema, ainda que iniciado por uma única pessoa, logo se torna de abrangência coletiva.
Qualquer pessoa pode procurar a Sespa para solicitar atendimento psicossocial a usuários de drogas. É preciso, no entanto, que haja iniciativa e comprometimento pessoal, já que os Caps não trabalham com a chamada “internação compulsória”, método em que o paciente é conduzido para a clínica contra a vontade. No site www.saude.pa.gov.br é possível encontrar os endereços e o passo a passo para atendimento em qualquer unidade mantida pelo governo do Estado.