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Prontuário afetivo aprimora cuidado humanizado no Ophir Loyola em Belém

Ferramenta procura saber sobre as preferências, interesses e resgata histórias e emoções dos pacientes

Por Ellyson Ramos (HOL)
02/04/2024 11h44

Nas enfermarias do Hospital Ophir Loyola (HOL), em Belém, um recurso implementado pela equipe multiprofissional vem contribuindo para a construção de um vínculo mais próximo e empático entre profissionais da saúde e usuários. 

Trata-se do prontuário afetivo que já é uma realidade no hospital referência em oncologia, e ajuda a compreender o contexto emocional e social dos usuários. Ao abordar predileção e sentimentos, como medo e ansiedade do indivíduo, os profissionais conseguem promover um suporte emocional mais eficaz.

Por meio do recurso, mulheres assistidas na clínica de oncoginecologia, no terceiro andar da instituição, são instigadas a compartilhar um pouco mais de si. A psicóloga do setor, Christianne Nascimento, explica que o formulário, preenchido pela equipe de psicologia, registra gostos e essências emocionais e sociais das usuárias.

Resgate de histórias e emoções  

“O paciente oncológico lida com muitas emoções e têm dificuldade de entender o adoecimento. Mas, por meio do prontuário afetivo, abordamos e coletamos informações sobre coisas que os pacientes gostam de comer, fazer e até sobre como preferem ser chamados. Trabalhamos os sentimentos, as emoções e trazemos situações específicas para que se visualizem de uma forma diferente. A maioria tem dificuldades de pensar em situações simples do dia a dia, como o prato favorito, mas, com o diálogo, vamos resgatando histórias e colocando o paciente como o centro e dono da própria vida”, disse.

Christianne explica ainda que o registro afetivo vai além do prontuário tradicional, que reúne dados clínicos, diagnósticos e sinais e sintomas relatados pelas pacientes à equipe de saúde. Diante da alta complexidade do tratamento oncológico, observar e praticar a escuta ativa dos usuários são atitudes benéficas, pois, de acordo com a especialista em psicologia hospitalar, valorizam a história pessoal, as emoções e as relações humanas.

“O prontuário afetivo superou as nossas expectativas. Às vezes, as pacientes estão mais rígidas ou tristes e não querem falar. Mas, quando explicamos o objetivo do prontuário e começamos a fazer as perguntas, elas abrem o coração. É curioso quando perguntamos ‘você é o amor de quem?’, pois algumas não reconhecem que são amadas por alguém, mesmo casadas e com filhos. Daí surgem choros e risos. Independente do sentimento e das respostas, acolhemos, pois queremos que elas identifiquem as suas vontades, desejos e validem sentimentos esquecidos”, afirmou a psicóloga.

Durante o preenchimento do prontuário, nada pode passar despercebido. Por isso, o momento exige atenção, calma e destreza do profissional, que também indaga sobre preferências musicais, alimentares e passatempos. É comum que, durante as abordagens, que medos, preocupações e fragilidades sejam expostas pelos usuários e acompanhantes.

“Eles (acompanhantes) também interagem, gostam desse cuidado e se mostram extremamente gratos a toda a equipe. Com o prontuário afetivo, o paciente não é como um caso clínico, mas como pessoa, que é ouvida e compreendida de forma singular. É um cuidado integral e centrado na pessoa”, afirmou Christianne Nascimento.

A operadora de bobinadeira, Silvia Cristina de Souza, 41 anos, descobriu o câncer no colo de útero durante um exame preventivo, realizado no posto de saúde da sua cidade natal, Castanhal, no nordeste paraense. “Graças ao exame (Papanicolau), eu descobri cedo o câncer.  E eu nem ia fazer, mas quando cheguei no postinho, a agente de saúde me perguntou se eu já tinha feito. Como eu disse que não, ela marcou logo para a semana seguinte. Se não fosse a agente de saúde, talvez eu nem soubesse ainda”, lembrou.

Ao descobrir o câncer e que o seu caso seria cirúrgico, ela confessa que foi tomada por um medo, sentimento que se intensificou com outro baque, a demissão do antigo emprego. “Meu marido me acompanhou em todas as consultas, mas no dia em que recebi a notícia (de que estava com câncer), eu estava sozinha. Fui demitida dias antes e lembro que, quando soube da doença, parecia que o céu tinha caído sobre mim. Apesar de a palavra câncer por si só já causar medo, a médica me acalmou e hoje eu já não estou mais tão abalada como eu fiquei no início”, recordou Cristina.

Foi durante o preenchimento do formulário que a equipe descobriu uma preferência da paciente: ser chamada pelo segundo nome, Cristina, ou simplesmente Cris. “Aqui eu me senti acolhida. Fora do hospital, a gente imagina outra realidade, a de que as pessoas que vêm para cá já estão no estágio final da doença. Mas, chegando aqui, vendo a situação e nas conversas com a equipe, a gente se acalma muito”, explicou Cristina, enquanto admitia não conhecer o prontuário afetivo antes da internação no HOL. “Não tinha ouvido falar, conheci aqui no hospital. Foi uma bela surpresa. Todo dia é uma conversa e a gente não se sente sozinha”, completou.

Psicóloga Christianne Nascimento preenche prontuário afetivo da paciente Cristina de SouzaO prontuário afetivo a deixou tão confortável, que passou a abordar outros assuntos com a ajuda da especialista. “Eu não sou capaz de falar sobre a minha vida com outras pessoas, sou muito reservada. Mas, conforme a psicóloga foi conversando comigo, eu me senti à vontade para falar. Falei sobre minha relação com o meu esposo, sobre a minha família, sobre meus gostos. Eu amo brega e amo dançar”, comentou Cristina, sustentando um largo sorriso.

Especialista em terapia de família e casal, Christianne explica a importância do prontuário afetivo, da escuta, das orientações e do suporte terapêutico destinado aos pacientes e familiares. “As interações com outras pacientes e com a equipe do hospital são muito positivas. É uma grande família. Aqui elas compreendem que não estão sozinhas e que esse momento é só uma fase. E o prontuário ajuda a trabalhar as emoções e nos permite externalizar muita coisa. É importante acreditar que, independente de qualquer situação, a gente não pode perder a força e a esperança”, explicou.