Produção de sabonete de açaí 'financia' expansão do acesso à água tratada
Startup Ver-o-Fruto funciona no Parque de Ciência e Tecnologia Guamá (PCT) e busca universalizar o sistema de tratamento de água na Amazônia
O que um sabonete artesanal feito a partir de resíduos (caroços) de açaí pode ter a ver com a ampliação do acesso à água tratada? A startup Ver-o-Fruto, que funciona no Parque de Ciência e Tecnologia (PCT) Guamá tornou essa relação possível ao apresentar um sabonete facial e a criação de sistema de tratamento de água que não necessita de aditivos químicos.
A engenheira de produção Ingrid Teles, pesquisadora e fundadora da Ver-o-Fruto, é a criadora. Ela explica que com a venda dos sabonetes, é possível acumular recursos para financiar a expansão do sistema de tratamento de água, já que o propósito de sua startup é universalizar o acesso à água segura na Amazônia.
A empresa desenvolveu um sistema de tratamento da água do rio com a semente do açaí, tornando-a própria para o consumo humano. Para ajudar as comunidades que não podem arcar com o valor do sistema, a empresa realiza a venda de sabonetes faciais produzidos com a semente residual do açaí: a cada sabonete vendido, R$1 é destinado à construção de um sistema para comunidades vulneráveis.
Na verdade, tudo começa com duas grandes inquietações de Ingrid sobre a destinação dos resíduos da produção açaizeira e sobre o acesso insuficiente de água tratada por populações moradoras das ilhas que cercam Belém. Recém-formada à época, ela começou a estudar o caroço do açaí e também ao da manga, e conseguiu desenvolver uma tecnologia para tratar a água doce.
"Eu precisava de um mercado para começar, mas não tinha dinheiro, nem patrocínio ou investidor. Minhas pesquisas me levaram ao cuidado com a pele, desenvolvi uma fórmula de sabonete de açaí para o rosto, e com o pouco que eu tinha, fiz minha primeira produção. Meu objetivo sempre foi criar uma base sólida, para depois voltar ao propósito do tratamento de água. Tudo que precisamos já está no nosso meio, não precisamos extrair nada. Olha a diversidade de coisas que pude fazer só com os caroços, os resíduos", explica.
Hoje, a produção é terceirizada e feita em Benevides, na região metropolitana de Belém, em uma fábrica que pode produzir até mil sabonetes por mês. "Não quero deter a produção. A Ver-o-Fruto é uma sala de 36m2 no PCT, e da forma como é, posso pensar em estratégia sem precisar pensar na produção. Temos um acordo, o terceirista tem minha formulação e só eles podem reproduzir. Eu quis que as parcerias ficassem no Pará. Tive muita proposta para terceirizar em São Paulo, mas quis aqui porque a matéria-prima está aqui, é um sabonete 100% paraense", conta Ingrid.
Multipremiada, a Ver-o-Fruto já conquistou o Mutua/Anprotec de Inovação e Empreendedorismo, StartUP Pará, Inova Amazônia, E-Hackaton de Água e Saneamento na América Latina e Caribe, Climaton, Incubação Young Water Fellowship Latinoamérica, edital Mulheres Empreendedoras ASG, prêmio Samuel Benchimol e honraria Alumni Diamante da Faculdade Estácio, além de participar da aceleração do BNDES Garagem de Impacto. Recentemente, estiveram em uma feira de oportunidades na África do Sul e nos próximos dias participam de outro evento do tipo em Caxias do Sul (RS).
Biodiversidade e bioeconomia - Ingrid parte do princípio que a bioeconomia é feita pelas pessoas que estão na floresta, e nada pode ser feito sem elas. "Estou em Belém, eu trabalho, mas não estou na ilha plantando, colhendo. O primeiro passo é olhar para o povo da floresta. Como a Ver-o-fruto atrela e fortalece essa cadeia: quando damos acesso ao básico, principalmente água e saneamento. Queremos ser facilitadores desse acesso de uma maneira mais em conta e de qualidade, mostrar aos interessados que queremos trabalhar juntos. Acreditamos no poder da transformação", finaliza.
O PCT Guamá é uma iniciativa do Governo do Pará, por meio da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Educação Técnica e Tecnológica (Sectet), que conta com a parceria da Universidade Federal do Pará (UFPA), Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA) e gestão da Fundação Guamá.
É o primeiro parque tecnológico a entrar em operação na região Norte do Brasil e tem como principal objetivo estimular a pesquisa aplicada e o empreendedorismo inovador e sustentável.
Situado em uma área de 72 hectares entre os campi das duas universidades, o PCT Guamá conta com mais de 40 empresas residentes (instaladas fisicamente no parque), mais de 60 associados (vinculadas ao parque, mas não fisicamente instaladas), 12 laboratórios de pesquisa e desenvolvimento de processos e produtos, com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e a Escola de Ensino Técnico do Estado do Pará (Eetepa) Dr. Celso Malcher, além de atuar como referência para o Centro de Inovação Aces Tapajós (Ciat), em Santarém, oeste do estado.
Membro da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), da Associação Internacional de Parques de Ciência e Áreas de Inovação (IASP), o PCT Guamá faz parte do maior ecossistema de inovação do mundo.