Psicólogos conduzem políticas de reinserção social dos internos do sistema penal
No dia em que se comemora a regulamentação da profissão de psicólogo no Brasil, profissional relata os desafios do trabalho entre os encarcerados
O psicólogo Marcos Alemplanque durante consulta com interno do sistema penal: individualização das pessoas é o desafioNo Brasil, o dia do psicólogo comemorado em 27 de agosto, foi instituído em 2016, por meio da lei nº 13.407. A data escolhida refere-se à regulamentação que aconteceu neste dia em agosto de 1962, quando a Psicologia torna-se, então, uma profissão de direito, apesar de já ser considerada uma profissão de fato desde o contexto da industrialização quando foi usada para orientar o trabalho nas fábricas, empresas e repartições.
A lei nº 4.119, sancionada pelo então presidente João Goulart, estabelece as regras para a atuação e o currículo mínimo para a formação do profissional de psicologia. A psicologia estuda o comportamento humano, e suas interações com o mundo à sua volta, por este motivo pode influenciar as relações de consumo, a comunicação de massa, as pesquisas de opinião, por exemplo.
Com o passar do tempo a psicologia busca novas formas de atuação profissional, e avança em novas áreas do conhecimento e de atuação, nesse contexto a atuação deste profissional dentro das unidades penitenciárias tem um papel fundamental durante a custódia dos internos.
Marcos Alemplanque atua como psicólogo da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) há mais de três anos. Segundo ele, a escolha profissional foi carregada de significados subjetivos e outros fatores intrínsecos e extrínsecos, mas o principal objetivo era ajudar pessoas com transtornos mentais.
“No momento em que escolhi iniciar a graduação em psicologia havia o desejo de realização pessoal pela idealização de ajudar as pessoas que sofrem de transtornos mentais, porém essa idealização foi se dissolvendo à medida que fui me submetendo ao processo de terapia no início do curso. Esse processo terapêutico mostrou que as técnicas funcionam e vão além de tratar transtornos mentais, mas conduzir o sujeito a lidar com sua angústia e sustentar seu desejo”, conta.
A curiosidade pela psicologia no cárcere veio ainda durante a graduação, inspirado pelas experiências de um professor, porém, com a não renovação do vínculo entre a instituição superior de ensino e o sistema prisional, Marcos não conseguiu fazer o estágio no sistema. A oportunidade só veio quando o psicólogo soube do concurso público da Secretaria, a aprovação transformou o interesse despertado enquanto estudante em realidade profissional.
Obstáculos – A psicologia tem uma série de dispositivos e tecnologias para avaliação e diagnóstico, isso serve para qualquer pessoa. Dentro das unidades penais também é usado para a condução de políticas públicas voltadas para a reinserção social.
Os desafios emocionais e psicológicos enfrentados pelos profissionais passam também pela individualização dos internos. “Cada pessoa que se encontra no sistema prisional, tem um nome, uma história, uma particularidade com referência ao que a levou estar privada de liberdade. O acolhimento e escuta tornam-se importantes instrumentos que resgatam essa narrativa pessoal. A possibilidade de dar sentido e de alguma forma se reconhecer nos fatores que culminaram na passagem pelo sistema prisional age sobre o sofrimento psíquico,” diz o profissional.
O contexto de trabalho exige posicionamento subjetivo e Alemplanque esclarece que o desafio das trabalhadoras e trabalhadores da psicologia é dosar o afastamento simbólico de sua pessoa e de sua atuação profissional.
“Para superar esses impasses são necessários planejamentos de treinamento e desenvolvimento que capacitem as equipes de trabalho para a dissolução da cultura organizacional de caráter punitivo, ou seja, estruturada para coagir, dando lugar à conciliação e colaboração mútuas. Tem sido um desafio contínuo manter o meu desejo na atuação, mas meus colegas de profissão estão empenhados em fazer avançar o trabalho no sistema prisional com compromisso e ética”, diz ele.
Terapia – A psicoterapia não é usada somente em casos de transtornos mentais, mas qualquer pessoa que tenha algo a dizer sobre a sua angústia pode ser beneficiada. “A psicoterapia não se contenta com ações que promovam ideia do homem cordial, que seja passivo e submisso na construção de sua história, mas que possa levantar questionamentos e pensar seu protagonismo enquanto sujeito, se desidentificar com antigos papeis sociais e construir laços sociais mais duráveis”, afirma o psicólogo.
Após o cárcere, o interno, ao voltar para a sociedade, precisa lidar com novas situações, nesse sentido, a autoestima e a autodescoberta precisam ser desejadas. “Despertar o desejo é como acender uma fogueira na escuridão que ao menos nos faz ter uma ideia de onde estamos. A pessoa que passa muito tempo encarcerada irá se deparar com muitas novidades, logo a saída ocasiona angústia, mas também possibilidade de realização de desejo”, explica Alemplanque, ao detalhar a importância da profissão para os internos do sistema penitenciário.
Texto de Yasmin Cavalcante – NCS/Seap