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SÃO FÉLIX E OURILÂNDIA

Convivência entre índios e outras etnias ajuda a preservar a natureza

Por Redação - Agência PA (SECOM)
05/08/2017 00h00

Localizado a 1.050 quilômetros de Belém, o município de São Félix do Xingu, no sul do Pará, chama atenção por duas características: estar, em extensão territorial, entre os 10 maiores municípios do planeta, maior que vários países da Europa, e pela convivência harmoniosa entre as diversas etnias indígenas que habitam a região e os moradores das áreas urbanas.

Devido à pecuária ser o alicerce de sua economia - o município tem o maior rebanho bovino do país, com quase 2 milhões de cabeças de gado - o visitante logo imagina que estará rodeado de homens e mulheres vestidos com calças jeans, e exibindo cinturões e chapéus de boiadeiro. No entanto, surpreende-se ao encontrar também cidadãos descendentes daqueles que habitam a região há pelo menos 900 anos, e cobrem o corpo com pinturas, pulseiras de miçangas e cocares multicoloridos.

São Félix do Xingu e Ourilândia do Norte, que já formaram com Altamira o maior município do mundo, possuem um dos maiores territórios indígenas do Pará, o que resulta na diversidade, interação e miscigenação.

Mesmo com a maioria dos indígenas morando em dezenas de aldeias espalhadas ao longo do Rio Xingu e da Rodovia PA-279 (no caso de Ourilândia), algumas bem distantes das sedes municipais, índios e não indígenas convivem em harmonia. Os índios incorporam a modernidade ao cotidiano das aldeias, e os moradores de outras etnias compreendem e respeitam suas características próprias de convivência.

As origens - Mas a história nem sempre foi assim. Em 1900, quando apenas os indígenas viviam por lá, ocorreu a primeira colonização efetiva do território de São Félix do Xingu, liderada pelo então coronel da Guarda Nacional, Tancredo Martins Jorge, que se deslocou da Bahia com seus familiares em busca de oportunidades econômicas. Seu grupo aportou primeiramente em Altamira, depois continuou a subir o Xingu até chegar ao Rio Fresco.

Em frente à confluência destes rios, o coronel decidiu erguer um acampamento. Em 20 de novembro daquele ano inaugurou uma pequena capela em homenagem a São Félix de Valois, na Ilhota São Félix (no Rio Xingu). Essa é a data de fundação do povoado, que em seguida se desenvolveu com o extrativismo vegetal, com destaque para a extração de borracha.

Dez anos depois, com o declínio do setor extrativista, a vila enfrentou sérias dificuldades econômicas, o que abriu espaço para novos segmentos, entre eles a exploração da castanha do Pará, das gemas minerais e dos metais preciosos, e o início da atividade pecuária, que levantaram o município e auxiliaram na sua promoção à condição de Distrito do Xingu (hoje Altamira), em dezembro de 1961, e à condição de município, em 10 de abril de 1962.

Hoje, paraenses, goianos, baianos, tocantinenses e mineiros, que escolheram viver em São Félix e também em Ourilândia (que já tem 29 anos de emancipação), formam uma população muito diversa, expandida ainda mais nas últimas décadas, após a abertura da PA-279, em 1976, que ligou os dois municípios à Rodovia BR-155, em Xinguara, dando maior mobilidade de saída, e principalmente de entrada, de pessoas de todas as regiões do Brasil.

Além da estrada, os rios Xingu e Fresco também exercem um papel importante nessa migração, sobretudo de indígenas. Membros do povo Kayapó chegaram de todo o país, povoando e criando as dezenas de aldeias existentes ao longo da vasta extensão territorial dos dois municípios. Durante cinco horas de viagem de lancha, partindo de São Félix, passa-se por várias delas. Mesmo em interação com outras culturas, os indígenas buscam manter seus costumes e tradições.

O cacique Patô Kayapó, líder de uma aldeia localizada a 30 minutos da sede municipal de Ourilândia do Norte, explica como os primeiros índios chegaram ao território. “Uma lenda diz que todos éramos de uma grande aldeia, onde existia um grande pé de milho. Esse pé foi derrubado e gerou uma grande briga, que fez nosso povo se separar, partindo para lugares de todo o Brasil, cada um formando sua própria aldeia. Nessas terras, por exemplo, ficou apenas o povo Kayapó”, conta o cacique.

Troca de conhecimento - Viviane Cunha, secretária de Educação de São Félix do Xingu, é uma das pessoas que mais mantêm contato com os indígenas daquele município. “Meu primeiro contato com eles foi em 2009, quando assumi a Secretaria. Logo no terceiro dia de trabalho todos os caciques das aldeias chegaram para conversar comigo. Confesso que meu primeiro sentimento foi de medo. Eles estavam todos pintados, com suas armas, falando somente em Kayapó, e de uma forma muito forte, pegando na gente com força, dando a impressão de serem agressivos. Mas no segundo mês de trabalho fui visitá-los, e aí foi amor à primeira vista”, afirma Viviane Cunha.

A secretária, que começou a visitar todas as aldeias do território de São Félix, mudou a visão que tinha. “Pude perceber que é um povo trabalhador, com muita produção e uma vida muito difícil, pois a infraestrutura das aldeias é muito comprometida. Alguns vivem até em condições sub-humanas, em casas de palha e cobertas com lona. Não há cama e muitos dormem em caixas de papelão no chão, o que dificulta a qualidade de vida deles. Mas tudo em nome da manutenção e do respeito à própria cultura, e da preservação da terra, sempre mantendo contato harmônico com a natureza e os animais, o que eu admiro muito”, ressalta.

Ao longo de mais de 100 anos de contato com outras etnias, algumas modernidades foram adotadas pelos Kaiapó, como o uso da televisão, do telefone celular, da geladeira e até mudança na dieta alimentar. “Hoje, alguns não dispensam ter esses aparelhos em suas casas. E quando eles chegam até a sede do município não resistem à carne de boi. Eles adoram churrasco e amam chocolate. Chegaram, inclusive, a nos pedir que inseríssemos esses itens na merenda escolar”, informa.

Viviane Cunha, que se tornou referência para os indígenas de São Félix, comenta que aprendeu muito com eles. “Aprendo muito, principalmente sobre o respeito pela cultura e pelas pessoas. Os mais velhos, por exemplo, são analfabetos, mas lutam para que as crianças e os jovens estudem, migrem para as cidades. Eles têm muita vontade que seus filhos e netos virem professores, médicos e advogados, mas que voltem para as aldeias e possam cuidar do seu povo. Pensar nas pessoas e manter essa troca de conhecimento é de extrema importância. Hoje, as escolas têm computadores, professores indígenas, merenda escolar com comida variada, e tudo isso só foi possível por meio da relação de confiança que conquistamos com eles”, afirma.

Em Ourilândia do Norte, a 107 km de São Félix, quem também conquistou a confiança dos caciques do município foi a professora Dalva Nogueira, de Língua Portuguesa. Ela, que leciona há sete anos para os Kayapó, também se emociona ao falar do seu trabalho, principalmente com as crianças. “Diferentemente dos alunos brancos, que muitos não nos repeitam nas escolas tradicionais, as crianças e jovens indígenas têm muito respeito pelo professor. Trabalhamos o dia inteiro e não chamamos atenção de nenhum. Eles vêm mesmo para estudar, e isso causa muita satisfação ao educador, que sai da cidade para vir ensiná-los nas aldeias”, declara Dalva Nogueira.

Ela conta que antes de iniciar o trabalho na aldeia chefiada pelo cacique Patô, conversou com ele para saber o que os indígenas esperavam dela. “Ele me mostrou a mão aberta e disse: ‘queremos contar, medir, somar, fazer o escrito e falar bonito’. É isso que eles esperam da escola, e sempre que estou aqui procuro responder a essa expectativa. Para os Kayapó é muito importante aprender o Português, pois eles ainda são enganados por algumas pessoas de ‘palavras bonitas’. Proteger e preservar a terra e a natureza também é um de seus maiores objetivos. Eles querem os professores aqui por compreender que a língua é uma ferramenta que pode tanto libertar quanto oprimir”, diz a professora.

Dalva, que se emociona sempre ao falar dos seus alunos, recebe os novos professores encaminhados para as aldeias com o seguinte ensinamento: “Tenho 25 anos de sala de aula e posso afirmar que toda minha teoria ficou pequena diante do que a gente vive aqui. Nossa relação com as crianças é muito ingênua e pura. Os Kayapó, por exemplo, não têm o abraço na sua cultura, e quando cheguei aqui senti falta disso, de abraçar meus alunos. Hoje, já abraço até o cacique e eles me abraçam, me beijam. Conquistar algo que não é da cultura deles é muito gratificante”.

Dentro das aldeias, as crianças indígenas iniciam na escola aos 2 anos, passando pela educação infantil até o 9º ano. Existe a interação com os não indígenas e a visitação à cidade. Ao atingir a maioridade, eles podem escolher ficar nas aldeias ou partir para o ensino superior.

Com muito potencial a ser explorado, Ourilândia do Norte e São Félix do Xingu possuem atrativos que chamam a atenção de turistas e amantes de aventuras. Eles procuram contato com a natureza e gostam se sentir a liberdade em terras ainda pouco desbravadas.

Ecoturismo - Em Ourilândia do Norte, o Parque Ambiental do Caiteté é um dos locais mais procurados. Com 29 hectares de área e localizado no KM-132 da PA-279, a cerca de 20 quilômetros da entrada do município, o parque está inserido em uma área nobre de preservação permanente. A vegetação nativa e exuberante atrai principalmente amantes do ecoturismo. No local é proibida a entrada de carros e motos, mas o acesso é facilitado por trilhas, que junto com a cachoeira rochosa de água gelada encantam turistas durante todo o ano.

O casal Everson Silva e Natália Coimbra chegou ao município a trabalho e aproveitou para conhecer as belezas do sul do Pará. “Esse clima selvagem, a mata fechada, a água limpa e bem gelada tornam essa experiência aqui fantástica. Encontramos a natureza realmente pura, e ter contato com ela dessa forma é sensacional”, garante Everson.

Natália foi seduzida no contato com as águas do Rio Caiteté. “É super geladinho e gostoso; ajuda muito a relaxar. A cidade também é bem tranquila, e estamos aproveitando bastante. Se tivermos oportunidade de vir morar para cá, vamos aceitar na hora”, garante a belenense. O parque tem entrada gratuita e pode ser visitado todos os dias da semana. Ao visitante é proibido caçar e pescar no local.

Localizada às margens do Rio Xingu, São Félix oferece excelentes opções de lazer. Quem busca praias em um cenário ainda selvagem, e contato direto com a fauna e a flora característica da região, se encanta rapidamente.

As praias ficam a poucos minutos de barco ou voadeira, disponíveis sempre no ponto dos barqueiros, ao lado do Porto da Marina, no centro da cidade. A Praia do Porco é uma das mais procuradas. No local há bares, restaurantes e pousadas, possibilitando ao turista passar vários dias tendo apenas o rio como entorno. O visitante tem ainda à sua disposição as praias do Remancinho, Chadá, Marçon e Ilha Grande, onde é possível a prática de camping, pesca esportiva e canoagem.

Este ano, o turista contou com mais uma atração: o “Veranejo”, um evento popular e gratuito, com shows de artistas nacionais, no centro da cidade, que atraiu durante os cinco finais de semana de julho cerca de 100 mil pessoas.

Vanessa Gregório, secretária de Turismo de São Félix do Xingu, comemora o aumento de turistas. “Nós já recebíamos muitas pessoas, mas a maioria partia direto para as ilhas. Nossa ideia é criar mais projetos como esse, que também prendem o visitante no centro da cidade. Temos muitos restaurantes, hotéis e um comércio capacitado para receber turistas de todos os locais do país”, informa Vanessa.

Como chegar:

Partindo de Belém, o acesso a São Félix do Xingu e Ourilândia do Norte é pela Rodovia BR-316, seguindo pela Alça Viária e PA-150, até Marabá. Em seguida, o trajeto é pela BR-155 até o município de Xinguara, de onde basta seguir pela PA-279, passando antes por Ourilândia, e com mais 107 km de estrada chegar a São Félix. A viagem até o ponto final dura quase 14 horas de carro. Quem preferir chegar mais rapidamente pode optar pelo voo de Belém a Marabá, com saída do Aeroporto Internacional, e depois seguir de Marabá até Ourilândia e São Félix do Xingu em aviões menores.

Confira as curiosidades e os atrativos da região do Xingu: