Cresce número de detentos aprovados no Enem Prisional no Pará
Com as cabeças raspadas, em comemoração pela aprovação no vestibular, dois internos do Presídio Estadual Metropolitano I (PEM I) foram, na manhã desta terça-feira (3), ao Instituto Federal do Pará (IFPA), em Belém, para efetuar matrícula na instituição. Os detentos foram aprovados através da nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para Pessoas Privadas de Liberdade (PLL), em 2014.
Ledimilton Rodrigues passou no curso de Saneamento Ambiental no IFPA por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Há cinco anos preso, ele concluiu o Ensino Fundamental dentro do presídio, pelo Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja), e agora o Ensino Médio através do Enem. A educação transformou a vida do interno. “Eu entrei aqui no presídio como um assaltante e traficante. Fui motivo de muita tristeza para toda a minha família, mas depois que peguei gosto pelos estudos não quis mais parar. Ainda não acredito que estou aqui fazendo minha matrícula para iniciar no curso superior”, disse o interno.
A mãe de Ledimilton, Ana Lúcia Rodrigues, fez questão de ir até a instituição ver o filho sendo matriculado. “Esse é um sonho realizado que eu queria que tivesse acontecido antes do meu filho se envolver na criminalidade. Infelizmente ele teve que ir preso para reconhecer o valor dos estudos, mas antes tarde do que nunca. Estou muito orgulhosa, pois é o único dos meus cinco filhos que será universitário”, contou a mãe emocionada.
Quem também estava ansioso para a matrícula era o interno Paulo Martinho, 30 anos. Ele concluiu o Ensino Médio antes de ser preso, mas foi no presídio que passou a se interessar pela leitura. Após tentar por três anos ele alcançou a tão esperada aprovação para o curso de Letras no IFPA. A dedicação e persistência fizeram a diferença na conquista de Paulo Martinho.
“Antes de ser preso eu nunca pensei em entrar em uma faculdade. Essa foi uma porta aberta no mundo de grades que vivemos. Faltam apenas seis meses para eu passar do regime fechado para o semiaberto e poder frequentar a universidade. Um curso superior é um divisor de águas na vida de qualquer pessoa e gostaria de dedicar essa vitória para a direção e servidores do setor de educação do PEM I, que me ajudaram muito, aos professores da Seduc e de todos que sempre acreditaram em mim”, agradeceu Paulo.
O Pará teve 749 inscritos no Enem PPL 2014, com a aprovação de 36 detentos. Este número representa um crescimento 44% de aprovados no exame, em relação ao ano de 2013, quando apenas 25 pessoas atingiram a pontuação mínima. Do total de presos aprovados no Estado este ano, cinco internos foram beneficiados pelo Sisu, que se baseia nas notas do Enem e concede aos candidatos vagas em universidade federais, estaduais ou em Institutos Tecnológicos de Ensino, como é o caso do IFPA.
Entre os detentos beneficiados pelo Sisu 2014, dois foram aprovados para a Universidade Federal do Pará (UFPA), dois para o Instituto Federal do Pará (IFPA) e um para a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa-Marabá). No ano passado apenas três foram aprovados através deste processo seletivo.
Destaque
O interno Pedro Henrique Araújo, 30 anos, que cumpre pena no Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (HCTP), em Santa Izabel, foi o interno com a maior nota na redação do Enem PLL, no Pará. Ele atingiu 820 pontos dos 1.000 possíveis e média de 690 nas outras disciplinas. Com a pontuação, o detento conseguiu uma vaga no curso de Cinema da Universidade Federal do Pará (UFPA). Um sonho que tinha desde jovem.
“Antes de ser preso eu já cursava Engenharia de Produção, mas sempre fui encantado com a sétima arte. Quando fiquei sabendo desse novo curso na UFPA foi que me interessei em voltar aos estudos. Em 2014 eu tentei uma vaga, mas minha pontuação no Enem 2013 foi muito ruim. No ano passado, eu participei das aulas do cursinho do ProEnem no presídio e tenho certeza que isso foi fundamental para minha boa pontuação na redação. Além da leitura, eu treinei muito para alcançar essa nota”, explicou o interno, que é monitor da biblioteca do HCTP.
Mais de 200 internos de sete unidades prisionais da Região Metropolitana de Belém participaram das aulas do ProEnem. O cursinho preparatório específico para o exame foi uma parceria entre a Divisão de Educação Prisional (DEP) da Susipe e a Seduc, que conseguiu cumprir o objetivo de aumentar o número de aprovados no Enem.
Além do Sisu, os internos também obtiveram bons resultados através do Programa Universidade Para Todos (Prouni), que oferece bolsas de estudo integrais (100%) e parciais (50%) em instituições privadas de ensino superior baseadas na nota do Enem. Somente no Presídio Estadual Metropolitano I (PEMI), três detentos foram aprovados através deste programa.
Entre eles está Hartur Fernandes de Lima, de 22 anos, que depois de quatro anos tentando uma vaga na universidade, através do Enem PPL, foi aprovado em 4º lugar este ano, com bolsa integral, para o curso de Engenharia da Produção, na Universidade de Santo Amaro (Unisa), campus Belém. Quando chegou ao presídio, Harthur possuía apenas o Ensino Fundamental e, a partir dos estudos na casa prisional, alcançou sua maior conquista. “Eu estou muito feliz, quero muito estudar, correr atrás porque já perdi muito tempo. Essa é só mais uma meta alcançada, mas sei que ainda não acabou”, conta emocionado.
Apesar do grande número de aprovados, aqueles que atingiram a pontuação mínima no Enem, nem todos os detentos foram classificados para ingressar nas universidades. De acordo com Aline Mesquita, gerente da DEP, isso ocorre por que os detentos precisam atingir a pontuação de corte do curso para obter a classificação. Mas isso não desanima os internos, que pela aprovação já conquistam a remissão da pena em 800 horas, o equivalente a 133 dias, de acordo com a Lei nº 12.433, de 29 de junho de 2011, aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Atualmente seis detentos, no Pará, são universitários e dois já concluíram o nível superior enquanto cumpriam suas penas.
“A Divisão de Educação fez todo o possível para que os internos pudessem realizar o sonho de ingressar na universidade. Como a maioria dos internos aprovados nas universidades ainda cumpre pena no regime fechado, eles precisam de uma autorização judicial para frequentar as aulas. Estamos junto com as famílias, advogados particulares e defensores públicos tentando garantir a vaga desses aprovados, pois sabemos da importância da educação no processo de ressocialização desses detentos, principalmente por conta da vitória em ingressar no ensino superior e buscar novas perspectivas de vida”, concluiu Aline Mesquita, gerente da Divisão de Educação Prisional da Susipe.