Agência Pará
pa.gov.br
Ferramenta de pesquisa
ÁREA DE GOVERNO
TAGS
REGIÕES
CONTEÚDO
PERÍODO
De
A
RÁDIO

Cultura FM retoma o programa 'Visagem' em temporada especial

Por Redação - Agência PA (SECOM)
26/05/2015 16h49

As comemorações pelos 30 anos da Cultura FM trazem de volta um dos programas mais experimentais já veiculados pela emissora. Transmitido de 2003 a 2010, o “Visagem”, de Guaracy Britto Jr., ganha nova temporada, com episódios inéditos. A estreia será dia 9 de junho, à meia-noite (de terça para quarta-feira), com produção musical de Ricardo Moebius e participação especial de Léo Bitar na paisagem sonora e na edição do programa.

Os temas dos novos episódios ainda estão sendo definidos, mas, em se tratando do “Visagem”, os ouvintes certamente terão muitas surpresas. Isso porque o programa nunca seguiu uma fórmula definida. “Vamos começar falando sobre o número 30, em alusão à data comemorativa da Cultura FM. Depois, quem sabe, mostrar pequenas e estranhas cartas que o programa recebe”, diz Guaracy, mantendo o tom de mistério que sempre marcou o programa.

A ideia do programa surgiu no início dos anos 1980, quando Guaracy pensou em juntar trechos de discos com poemas e microcontos autorais. “Daí gravei uma fita e dei uma cópia para um amigo que trabalhava como gerente de produção musical numa rádio em São Luís, no Maranhão. Tempos depois, nos reencontramos em São Paulo, e ele disse que sempre ouvia aquela fita. Foi então que ele sugeriu que eu fizesse um programa”, conta Guaracy Britto Jr., que trabalha como redator na TV Cultura desde 1990.

Quando surgiu o convite para realizar um programa de rádio, Guaracy resgatou essa antiga ideia, chamando Ricardo Moebius para a produção musical. “Mais do que escolher a música certa, era preciso mergulhar na proposta do programa, traduzir musicalmente as histórias criadas, e nisso o Ricardo sempre foi muito bom”, conta Guaracy, com a voz meio grave e onipresente que levava os ouvintes a uma verdadeira viagem.

Ao todo, foram produzidos quase 100 programas, com uma hora de duração cada, todos cuidadosamente elaborados. Alguns trouxeram entrevistas com personalidades como Arnaldo Antunes e Zé do Caixão, que falou sobre as experiências de ir ao inferno e de se comunicar com os extraterrestres. Tsunami, bruxas, som e silêncio, lua, contos de terror. Temas inusitados, surreais e às vezes até bizarros davam o tom do “Visagem”, que também se valia do realismo fantástico da literatura amazônica, mas sem ficar preso a regionalismos.

O experimentalismo do programa chamou a atenção da jornalista e pesquisadora Sandra Garcia, que analisou 46 programas para a construção da tese de doutorado “Visagem: Música, poesia e experimentação sonora na Rádio Cultura FM do Pará”. Segundo a pesquisa, a narrativa do programa se encaixava em mais de um gênero radiofônico, se aproximando muitas vezes da literatura. “O conto é o tipo de narrativa mais presente. É uma narrativa que casa bem com o rádio, devido ao seu poder de síntese e de objetividade, atributos essenciais na linguagem radiofônica. Prosa e poesia se entrelaçam a cada edição; da poesia lírica o narrador usufrui da livre imaginação”, escreveu a pesquisadora.

Os personagens criados por Guaracy não tinham nada de comuns, a começar pelos nomes: Palano, Sonata, Tussicleide, Caxemira, Elvira Ponda, Folículo Ferreira, Guga Heráldica, Melanina. O “Visagem” trazia também personagens reais, que contavam seus dramas no quadro “Caixão de Notícias”. Mas todos sempre envolvidos em histórias absurdas, como a de uma senhora que, na adolescência, foi amiga de uma Matinta Perera.

“No ‘Visagem’, não será mais o texto, não será mais a música e sim um outro objeto feito da colagem de pedaços de texto e pedaços de música. O que nasce daí é um programa único, feito um mosaico, ordenado aparentemente sem critério. Aparentemente, porque o programa procura uma costura entre os vários pedaços que o compõem. Há uma lógica a ser perseguida, pois há uma preocupação em se fazer entender”, explica Sandra Garcia.

Houve ainda o episódio em que Guaracy propôs uma “brincadeira” com o aparelho de rádio. “Convidei o ouvinte a girar o botão left/right do aparelho, e assim perceber que em cada lado, em cada caixa acústica, tocava uma música diferente. Assim ele podia escolher o que ouvir”, relembra. “Em outro episódio, foram colocadas todas as músicas do programa ao mesmo tempo, e fomos tirando uma de cada vez, até restar a última música, sozinha”.

Na tese de doutorado, Sandra Garcia observou que tantas particularidades conferiam ao “Visagem” uma característica importante: cada programa é uma experiência única, que exige do ouvinte o que ela chamou de “escuta cuidadosa”. “Só um programa que envolva o ouvinte a um arsenal de sonoridades pode levá-lo a continuar sua audição particular; do contrário, muda de estação". Sobre o experimentalismo do programa, a pesquisa mostrou que cada edição testa diversas fórmulas e recursos que podem ser utilizados no rádio. "Foi uma espécie de cobaia na Rádio Cultura FM: do processo de montagem à veiculação eram testadas formas de narrativa, músicas, efeitos, vinhetas, enfim. O fato de ser veiculado por uma emissora pública, sem dúvida, proporcionou o espaço ideal para a experiência”.