Política estadual garante acesso e cidadania aos surdos no Pará
O diretor da Unidade Especializada Professor Astério de Campos é surdo e há 25 anos é servidor público concursado do Estado. Ele foi aluno da unidade que dirige e foi um dos primeiros formados pelo Curso de Letras com habilitação em Língua Brasileira de Sinais (Libras) ofertado pela Universidade do Estado do Pará (Uepa). No Dia Nacional do Surdo, comemorado nesta terça-feira, 26 de setembro, Arlindo Gomes é um exemplo do acesso à educação e cidadania garantido pelas unidades especializadas no Estado.
A data marca a inauguração do Instituto Nacional de Educação de Surdo (Ines) em 1857, no Rio de Janeiro, que foi a primeira escola para surdos do Brasil. Atualmente, mais de 45,6 milhões de brasileiros declaram ter alguma deficiência, segundo dados do Censo Demográfico 2010, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Cerca de 9,7 milhões (ou 5,1%) disseram ter deficiência auditiva. A deficiência auditiva severa foi declarada por mais de 2,1 milhões de pessoas; destas, cerca de 300 mil são surdas.
O Governo do Estado mantém dois grandes institutos como referência educacional especializada à surdez, o Professor Astério de Campos, que atende crianças até a idade adulta, e o Felipe Smaldone, fundado em 1930, na Itália, pelo padre Felipe Smaldone, e que é mantido pela congregação das Irmãs do Sagrado Coração, em convênio com o Estado.
A vendedora ambulante Rosana Vieira, 31 anos, moradora do Tapanã, não deixa de acompanhar, todos os dias, a filha Rebeca Melo, de nove anos, até a Unidade de Ensino Especializado Professor Astério de Campos, no bairro do Marco. Na unidade, a menina cursa o 3º ano do Ensino Fundamental. “Eu noto que ela está se desenvolvendo bem. Ela faz o ensino regular aqui na Astério e tem reforço de Língua Portuguesa e Libras em um centro da própria Seduc”, declara Rosana.
Curso Superior
Arlindo Gomes integrou a primeira turma formada pelo convênio entre a Uepa e a Universidade Federal de Santa Catarina para a criação do curso superior de Libras. O curso tem ainda o objetivo de formar professores da educação básica e também intérpretes da Língua Brasileira de Sinais para atuar em diversos segmentos da sociedade. “É uma questão de identidade, a comunidade surda quis que uma pessoa surda dirigisse a instituição. É uma conquista minha também nesta área, pois fui reconhecido pelo meu trabalho e pela qualificação que tive nesta área”, afirma Arlindo.
A coordenadora do curso, Raquel Gomes, explica que a formação é direcionada tanto para a pessoa surda quanto para ouvintes. “A Libras é a segunda língua oficial do País. Desde que foi criado, o curso já formou mais de 70 profissionais que estão hoje no mercado para suprir a necessidade criada com o Decreto de Lei 5.626, sancionado em 22 de dezembro de 2005, que exige que todas as instituições de educação no Brasil (básica e superior) devem ter instrutores e profissionais de Libras em seu quadro de magistério.
“Nós modificamos o vestibular para que ele também fosse realizado em Libras para garantir a acessibilidade do surdo. A sociedade evoluiu no que diz respeito à acessibilidade física, mas a linguística ainda não é garantida. Muita gente ainda pensa que é somente uma linguagem de gestos, mas possui uma estrutura gramatical, níveis linguísticos que a fizeram ser elevada ao status de língua”, explica.
Atualmente, na unidade Astério de Campos também funciona um cursinho preparatório ao Vestibular. O cursinho está em atividade desde 2002 e favorece a inclusão dos estudantes surdos por meio do ensino das disciplinas na primeira língua do aluno: a de sinais.
Muitos alunos da unidade são aprovados nas universidades públicas e privadas. Em 2016, o curso preparatório “Vestibulibras” contribuiu para a aprovação de 19 alunos surdos da rede estadual no vestibular em cursos diferenciados. Na unidade Astério de Campos são desenvolvidas ações de socialização do estudante surdo, com o “Corpos Falantes”, que reúne 20 alunos e ex-alunos da escola em apresentações culturais em eventos.
Mais de mil alunos surdos estão matriculados nas escolas estaduais
A Secretaria de Estado de Educação (Seduc) já formou 300 professores da rede pública de ensino do Estado do Pará em Língua Brasileira de Sinais (Libras). As aulas foram ministradas por sete instrutores aprovados em processos seletivos, sendo seis deles com deficiência auditiva, como forma de facilitar o processo de aprendizado. Atualmente, a rede pública de ensino do estado do Pará atende cerca de 10 mil alunos que têm alguma deficiência (auditiva, visual, intelectual, físico-motora, autistas e com altas habilidades).
A Educação Especial da Seduc contabiliza 1.148 alunos ativos surdos matriculados nas escolas estaduais no Pará. O atendimento a esse público específico, abrangendo estudantes e até pais de alunos, está a cargo da Coordenadoria de Educação Especial (COEES), vinculada à Secretaria Adjunta de Ensino da Seduc (Saen).
O estudante com surdez ou deficiência auditiva recebe o Atendimento Educacional Especializado (AEE), por meio de 630 salas de Recursos Multifuncionais distribuídas nas escolas da rede regular de ensino. Ele é encaminhado de algum setor de saúde, educação ou assistência para as instituições especializadas ou escola com salas de recursos. “Nesse processo, a família deve buscar os recursos que possam favorecer o desenvolvimento do indivíduo. O acolhimento da família e o desenvolvimento da comunicação são primordiais. A família deve investir na pessoa surda”, afirma a coordenadora da COEES, Kamila Vallinoto.
O atendimento aos estudantes é extensivo a famílias, professores e comunidade em geral, que contam com cursos gratuitos no Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e Atendimento a Pessoas com Surdez (CAS). Os cursos são disponibilizados semestralmente em níveis e horários variados, e possibilitam, inclusive, que pais e mães aprendam a se comunicar com os filhos surdos, por meio da Libras.
Em 2017, o CAS completa 13 anos de fundação. O Centro capacita profissionais do setor educacional e da comunidade para atender a cidadãos com surdez, como parte da educação inclusiva. Famílias são orientadas quanto a aspectos relacionados à surdez, Língua de Sinais, cultura e identidade surda.
O CAS atendeu 36 alunos no curso de Libras no primeiro semestre e tem 330 alunos (surdos e ouvintes) matriculados neste segundo semestre. No Projeto Língua Portuguesa como Segunda Língua para Alunos Surdos são 28 pessoas matriculadas. São 13 alunos surdos no projeto Letramento do Português e Matemática; sete alunos no Construindo Saberes Matemáticos através do Artesanato e 20 alunos (surdos e ouvintes) na Turma de Libras para Familiares de Surdos.
Desde 2014, o CAS já atendeu 5.910 alunos no Curso de Libras e 2.387 professores. Desde domingo, dia 24, as unidades da COEES realizam programações envolvendo alunos, professores e famílias para marcar o Dia Nacional do Surdo.
Além da Astério de Campos, que é referência no atendimento aos alunos surdos, cegos e com deficiências múltiplas associadas à surdez, do Instituto Felipe Smaldone e do CAS, em Belém, o Estado também possui outros polos de atendimento: a Unidade Técnica Especializada de Abaetetuba; a Unidade EES Marli Almeida Fontenelle de Castro (Santo Antônio do Tauá); Unidade de Ensino Especializado Giovani Emmi, em (Santa Izabel do Pará) e Unidade de Ensino Especializado José Tadeu Duarte (Santarém).
Música no silêncio
O Instituto Estadual Carlos Gomes (IECG) promove todos os anos, o Festival de Música no Silêncio (Femusi), que surgiu em 2015 com a proposta de inserir os estudantes no universo da linguagem dos surdos. Para isso, o festival conta com intérpretes para que as pessoas com surdez possam participar de concertos musicais. Os concertos também são produzidos com arranjos musicais com percussões e sons graves, proporcionando maior sensação das vibrações sonoras.
Plano Existir
A Central de Interpretação de Libras do Pará (Cilpa), que funciona no Centro Integrado de Inclusão e Cidadania (CIIC), tem a missão de minimizar as barreiras de comunicação de deficientes auditivos e surdos, por meio da interpretação e tradução da Libras. Já são cerca de 90 pessoas cadastradas na central, que conta com duas intérpretes.
Os serviços prestados compõem o Plano Estadual de Ações Integradas para Pessoas com Deficiência, o “Existir”. A unidade é coordenada pela Secretaria de Estado de Assistência Social, Trabalho, Emprego e Renda (Seaster), em parceria com a Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência.
A Cilpa funciona de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, no CIIC, localizado na Avenida Almirante Barroso, 1.765, Marco. Os serviços podem ser acessados pessoalmente na Central de Libras, pelo e-mail centraldelibras@seas.pa.gov.br e pelos telefones (91) 3277-3674, 3276-1339 e 3277-4214.
* Colaborou Eduardo Rocha - Ascom Seduc