No Pará, abelhas geram renda, preservam a floresta e produzem mais que mel
O governo do Estado, por meio da Sedap e Adepará, estimula e desenvolve a cadeia da meliponicultura e apicultura. Ano passado, a produção ultrapassou, em média, 700 toneladas do produto, gerando R$ 16,24 milhões em receita.
Apesar de minúsculas em tamanho, as abelhas têm uma enorme responsabilidade com o planeta. Sem elas, certamente, a produção de alimentos no mundo não existiria. Nesta sexta-feira (3), é celebrado o Dia Nacional das Abelhas, data criada para marcar a importância desse pequeno animal tão importante para diversas atividades, especialmente a agropecuária. O trabalho delas é responsável pela produção de cerca de 50 mil toneladas de mel no País. No Pará, no ano passado, foram produzidas, em média, 746 toneladas do produto, gerando uma receita de R$ 16,24 milhões.
Apesar de serem associadas inevitavelmente ao mel, as abelhas produzem própolis, geleia real, pólen entre outros. A partir do trabalho delas, são gerados produtos como sabonetes e até pasta de dente. No mundo todo, são mais de 1,5 mil espécies, apesar das mais conhecidas serem as africanas (Apis). As principais polinizadoras, no entanto, são as chamadas abelhas sem ferrão, cuja atividade de criação recebe o nome de meliponicultura.
A atividade está presente em todas as regiões do Estado, conforme acompanhamento da Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca (Sedap), que está finalizando o Programa Estadual de Desenvolvimento Sustentável da Cadeia Produtiva das Abelhas no Pará (PróAbelhas), e também a regulamentação, através de decreto, da Lei da Apicultura (Lei nº 7.055, de 12 de novembro de 2007), que institui a Política Estadual para o Desenvolvimento e Expansão da Apicultura. O acompanhamento do trabalho de manejo das abelhas com e sem ferrão (nativas) é feito pela Coordenadoria de Produção Animal (Copan).
Indicação Geográfica - O Pará é o primeiro Estado do País a ter o mel sendo trabalhado com a Indicação Geográfica (IG), mostrando-se como importante fonte de renda alternativa para os produtores no nordeste paraense, mais precisamente dos municípios de São João de Pirabas e entorno, como Santarém Novo, Salinópolis, Quatipuru e Primavera, na região nordeste do Pará.
“A Sedap está sempre buscando recursos para trabalhar ainda mais as comunidades. Nessa valorização do produtor de abelha, estamos trabalhando a IG do mel em São João de Pirabas e municípios adjacentes. Um trabalho que vem de outra coordenação em parceria com a nossa, para que a valorização desses produtos seja ainda maior”, explica o coordenador da Copan, o técnico agrícola Ândrio de Andrade.
A arte de cuidar de abelhas - Bem pertinho da capital paraense, mais precisamente a 23 quilômetros de distância do centro de Belém, no município de Ananindeua, é possível encontrar uma propriedade modelo com cerca de quatro hectares, onde é desenvolvida a atividade da meliponicultura periurbana, pelo produtor Rubens Franco, que faz da sua paixão por abelha uma fonte de renda. O “assistente da natureza”, como ele se define, diz que desde 2011 substituiu a atividade da advocacia pela arte de cuidar das abelhas.
Na propriedade, situada na área de transição entre os dois municípios, na Rua Ricardo Borges, no bairro da Guanabara, ele cria abelhas das espécies Apis mellifera (com ferrão) e as sem ferrão - uruçu-amarela, uruçu-cinzenta e Trigona pallens, conhecida popularmente como “olho-de-vidro”, canudo (Scaptotrigona postica) –, que é a que faz a polinização da flor do açaizeiro; abelha feiticeira (do chão) e a abelha mosquito. Há 40 caixas de abelhas distribuídas pela propriedade.
Com especialização em Gestão Ambiental, o meliponicultor diz que não só tem paixão pelas abelhas, como por tudo que elas representam em sua vida. Ele faz o manejo e vai acompanhando o resultado. Afirma que a coroação do seu trabalho é a produção do mel. “Esse resultado é o que mostra que o entorno e o ambiente onde as abelhas estão inseridas está adequado”, garante.
Quando começou, há 12 anos, lembra Franco, trabalhava apenas com a “uruçu-amarela” e, por indicação de um amigo, incluiu outras espécies na sua propriedade. Mais do que uma fonte de renda, as abelhas são, para ele, parte da vida.
“Quem gosta de abelha, gosta, independente se ela produz ou não o mel. A abelha está sempre nas minhas horas de felicidade e também de tristeza, que são menos, mas existem. Quando você abre uma caixa e sente o aroma, que maravilha. Quando você colhe o mel, fica feliz. É significativo”, detalha.
Além de se debruçar sobre a criação de abelhas, Franco cultiva variadas espécies frutíferas e plantas ornamentais, além das que produzem essências, como a baunilha. Entre as frutíferas, estão cupuaçu, abacaxi, maracujá, banana, cacau e açaí, cuja polinização é feita pelas espécies canudo e a “olho-de-vidro”.
O meliponicultor explica, ainda, que, nas diferentes caixas onde as abelhas fazem o trabalho, elas estão divididas de acordo com as espécies. “Esse ano, como está chovendo muito, a florada ainda não veio. Pode ser que não venha. Mas, a gente não tem que ficar triste. Temos que ficar felizes porque as abelhas estão vivas e estão produzindo, não para nós 100%, mas para elas, que vão se multiplicando”, diz.
Um dos investimentos que o meliponicultor faz no seu trabalho é com relação ao uso e divisão das caixas onde as abelhas fazem o trabalho. Segundo ele, há uma competição muito grande entre elas e até a direção e o posicionamento da entrada têm influência. “Eu deixo mais espaçado, que é para elas terem mais opções de obter o recurso floral e o resultado é que já temos pote de mel para elas e para nós, apesar das chuvas. Não é bom ter muita caixa na propriedade porque senão tem muita competição por alimento. Aí elas não produzem mel”, detalhou.
Apesar de trabalhar maciçamente com abelhas sem ferrão, o criador também trabalha com a Apis mellifera. Em função da localização da propriedade, o permitido é ter até três caixas, segundo informou.
Uma das espécies que chamam atenção na sua propriedade é a chamada “abelha mosquito”, cujo tamanho chega a, no máximo, de 4 a 5 milímetros. ”Essa abelha também faz parte do conjunto de visitantes florais de todas as espécies vegetais da nossa floresta”, explica. Os minúsculos seres trabalham em uma minicaixa, cujo tamanho, segundo explica Rubens Franco, é de 7 por 7, onde cabem 200 indivíduos, no máximo. “Esse é o nosso dilema enquanto criador de abelha. Mostrar para as pessoas que não é só a abelha com ferrão que faz a diferença. As que estão adaptadas há milênios, como essas aqui, ou a abelha canudo ou a uruçu-amarela, que visitam as nossas flores e fazem a polinização para surgir o alimento”, completou.
Valorização da atividade - Para estimular a valorização da atividade, em especial na Amazônia, a Sedap investe em ações para desenvolver a apicultura (com ferrão) e meliponicultura (sem ferrão). Para a Secretaria, é importante mostrar que, por trás da sociobiodiversidade que compõe o bioma amazônico, está o trabalho das abelhas, como ressaltou o coordenador de produção animal da Secretaria, Ândrio de Andrade.
Em recente visita à propriedade do meliponicultor Rubens Franco, ele destacou o trabalho realizado no local. “Quem dera que tivesse essa iniciativa por outros moradores da região, tendo as abelhas no seu quintal, tanto para trabalhar o manejo quanto a produção. Para falar de abelhas, é importante levar em consideração as pessoas que estão por trás, fazendo o trabalho. É preciso entender a dinâmica de cada espécie de abelha e a biologia, e isso a gente encontrou aqui”, observa Andrade.
O cadastramento dos criadores de abelha é feito por meio da Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Pará (Adepará), sendo obrigatório pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). A Sedap, por meio da Copan atendeu a solicitação para intermediar e organizar junto à Adepará uma ação de cadastramento dos criadores de abelhas para que os produtores possam se formalizar e ter acesso aos benefícios, como mercados mais amplos e obtenção de certificações de qualidade, além do fortalecimento da cadeia produtiva e atualização do cadastro sanitário. Entre os municípios visitados, como relembra Andrade, estiveram Acará (na Região de Integração Tocantins), Concórdia do Pará e Tomé-Açu (Região de Integração Rio Capim), com a participação de 30 criadores de abelhas com e sem ferrão.
A Adepará, por sua vez, trabalha com o Programa Estadual da Saúde das Abelhas (Pesab), cujo objetivo é apoiar a apicultura e a meliponicultura no Estado do Pará, por meio das atividades pertinentes à Defesa Sanitária Animal, como educação sanitária, investigação epidemiológica, diagnóstico, monitoramento, controle e prevenção de pragas e doenças. O objetivo é manter as colmeias saudáveis, garantindo produção adequada em quantidade e qualidade de produtos, além de contribuir para a polinização dos pomares, essencial para a agropecuária do Pará.
Algumas curiosidades sobre as abelhas - O coordenador da Copan, Ândrio de Andrade, especializado no dia a dia das abelhas, destaca algumas curiosidades sobre elas. As abelhas dão um verdadeiro exemplo de organização. Seguem à risca uma hierarquia rígida de três níveis sociais: a abelha rainha, os zangões e as operárias, sendo, portanto, altamente sociais, vivendo em colônias.
Uma única abelha melífera (Apis mellifera) normalmente visita cerca de 7 mil flores por dia, mas são necessárias 4 milhões de visitas para produzir um quilo de mel.
O método de construção das abelhas sem ferrão é um exemplo de sustentabilidade: elas reciclam e reaproveitam a cera sempre que possível, raspando restos de cera de outras colônias para misturar com a sua.
Estratégias de construção: As estruturas construídas, como os favos de cria (discos de cria) e as lamelas de cerume, são feitos de forma a otimizar o espaço e a proteger a colônia.
A construção de ninhos em ocos de árvores, em postes ou até mesmo de forma externa mostra a adaptabilidade e o uso de recursos variados do ambiente.
Eficiência de recursos: O uso do cerume, que combina cera e resinas vegetais, permite que as abelhas construam estruturas resistentes, impermeáveis e com propriedades antimicrobianas, sem gastar uma quantidade excessiva de cera pura, que tem maior custo de produção.