Pará se mobiliza para que recursos da ferrovia de Carajás não saiam do Estado
Os cofres da União estão prestes a receber uma quantia que o mercado estima em torno de 25 bilhões de reais, oriunda do pagamento de outorgas por empresas concessionárias de cinco ferrovias federais, cuja concessão está em vias de expirar. Entre elas está a Estrada de Ferro Carajás, utilizada no transporte do minério extraído pela Vale de território paraense. A mineradora pretende antecipar a renovação da concessão, pagando alguns desses bilhões de reais pela outorga, mas o destino do dinheiro ainda é incerto.
Nesta terça-feira (14), o secretário de Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia do Pará, Adnan Demachki, vai a Brasília reivindicar esses recursos, para viabilizar a construção da Ferrovia Paraense, o mais importante projeto de infraestrutura do governo estadual. “É indiscutivelmente justo que o Governo do Estado do Pará pleiteie esses recursos”, diz o secretário.
O pleito será feito, pessoalmente e por ofício, ao ministro dos Transportes, Mauricio Quintella, e ao secretário especial Adalberto Santos Vasconcelos, gestor do Programa de Parcerias de Investimentos, onde tramitará o pedido.
As empresas concessionárias de ferrovias, como a Vale, foram estimuladas a abrir processos de prorrogação antecipada dos contratos de concessão com a edição da Lei 13.448, em 5 de junho de 2017. A intenção do governo federal, ao propor novas diretrizes para prorrogação antecipada desses contratos, foi antecipar investimentos para estimular a economia neste cenário de crise cujos recursos auferidos expandiriam a capacidade de transporte do setor ferroviário.
Risco
Há também outros interesses em jogo. A antecipação da renovação de concessão possibilita a criação de uma fonte imediata de arrecadação. A Lei 13.448/2017 diz que o pagamento pela outorga pode ser em dinheiro ou em investimentos, mas também determina que os valores sejam aplicados de acordo com o interesse da administração pública, sem especificar onde.
É aí que mora o perigo. Especula-se, no setor de infraestrutura, que o dinheiro a ser pago pela Vale na renovação antecipada da outorga de concessão da Estrada de Ferro Carajás poderá migrar para bem longe do Pará, o Estado que recebe o maior impacto social e ambiental da ferrovia, que abriga as reservas do minério nela transportado e que contribui, somente com essa carga, com mais de 20 bilhões de reais para o equilíbrio da balança comercial brasileira. O Pará detém o segundo maior saldo da balança comercial no Brasil.
Estaria em estudo a aplicação do dinheiro ou investimento da outorga da Estrada de Ferro Carajás na ressurreição da Ferrovia Transnordestina, planejada para ligar as regiões produtoras do Nordeste aos portos de Suape, em Pernambuco, e Pecém, no Ceará, mas que, 11 anos depois do início das obras, em 2006, vai do nada para lugar nenhum e é apontada como um ralo de dinheiro público e um berço de corrupção.
De acordo com o Tribunal de Contas da União, que já abriu sete investigações sobre a Transnordestina, a obra da ferrovia, estimada em 4,2 bilhões e prevista para ser inaugurada em 2010, já consumiu 6,3 bilhões de reais, assentou apenas metade dos trilhos e só poderá ser concluída em 2021, a um custo total de 11,2 bi, quase o triplo do orçamento original.
No rastro desse empreendimento, a maior fábrica de dormentes do mundo, criada para abastecer a ferrovia, foi fechada porque a produção tornou-se obsoleta, deixando 600 funcionários desempregados e quase 400 mil peças de dormentes abandonadas. Ao longo da obra parada, há uma fila enorme de vagões largados no sertão, pilhas de trilhos enferrujados e dezenas de máquinas virando sucata.
Além da Transnordestina, outra opção do governo federal é destinar os recursos para ampliar a malha ferroviária do Sudeste, pois o TCU, em janeiro de 2017, proibiu o repasse de recursos públicos para a Transnordestina.
O secretário Adnan Demachki não acredita que o governo federal possa descumprir a determinação do TCU, colocando em risco um volume tão grande de recursos, nem crê que o programa de Parceiras de Investimento desconsidere a oportunidade de viabilizar a Ferrovia Paraense. “É um projeto seguro, decisivo tanto para o Estado do Pará como para o Brasil e que já tem o apoio de nove grandes empresas, devendo movimentar por ano 80 milhões de toneladas de carga, quase o triplo do que é estimado pela Transnordestina”, observa Demachki.
Vantagens
A Ferrovia Paraense terá 1.312 km de extensão, passará por 23 municípios, vai conectar todo o leste do Pará, desde Santana do Araguaia até Barcarena, atendendo a uma das maiores províncias minerais do mundo e a grande fronteira do agronegócio, que ainda carecem de logística apropriada, com potencial para o transporte mais barato de ferro, bauxita, grãos, fertilizantes e combustíveis, entre outras cargas.
O projeto também faz bem ao Brasil, porque se conecta com a Ferrovia Norte-Sul, permitindo o acesso de produtores de minério e do agronegócio em todo o País à rota estratégica de exportação, pelo Porto de Vila do Conde, que encurta a distância entre o Brasil e os principais destinos das exportações: os portos de Rotterdam, na Europa; de Xangai, na China, e de Miami e Los Angeles, nos Estados Unidos, normalmente acessados pelos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR).
Enfim, outro bom motivo para a mobilização é a preocupação do projeto da Ferrovia Paraense com aspectos ambientais. Todo o traçado foi definido para produzir o menor impacto possível ao meio ambiente. Além disso, a ampliação do modal de transporte ferroviário, por si só, já garante a redução de fatores de poluição ambiental. Estima-se que um trem de 100 vagões ajuda a retirar mais de três mil caminhões das estradas do País, diminuindo as emissões de dióxido de carbono (CO2) e monóxido de carbono (CO), gases responsáveis pelo aumento do efeito estufa.
“Os planos de desenvolvimento sustentável do Pará, que preveem o crescimento do produção sem descuidar da preservação de riquezas naturais, são plenamente atendidos pela Ferrovia Paraense, que deverá transformar o cenário econômico do nosso Estado”, diz Adnan Demachki. “Já está mais do que na hora de o Pará ser recompensado pelos sacrifícios que tem feito pelo Brasil”.