Adesão do Pará à Independência traz reflexão sobre a identidade do povo paraense
O visitante que chega atualmente ao Palácio Lauro Sodré não imagina quantas decisões importantes ali foram definidas; uma delas, a Adesão do Pará à Independência do Brasil de Portugal, em 15 de agosto de 1823, data que completa neste feriado 195 anos. O local, construído no final do século XVII pelo famoso arquiteto Antônio Landi, abrigou a corte portuguesa no Pará e desde a década de 80 funciona como um importante museu do Estado.
Um de seus grandes salões, por exemplo, foi palco de uma assembleia que reuniu 107 autoridades da então Província do Grão-Pará, que ali decidiram assinar uma ata que colocaria fim à hegemonia portuguesa no Estado e o integraria ao restante do Brasil, que já havia declarado a Independência em 7 de setembro de 1822.
Mas o que alguns não conhecem da história é que a data marca também uma grande disputa de poder, que infelizmente, culminou com a morte de muitas pessoas. Portugueses, em maioria comerciantes e grandes latifundiários, não aceitavam a independência, por receio de perder privilégios econômicos e políticos, mas ameaçados pela esquadra do almirante Greenfell, enviado por Dom Pedro I, não tiveram escolha a não ser assinar a “libertação”, sob a ameaça de ter a cidade invadida e bombardeada.
“Sabemos que foi uma independência impositiva e que trouxe a morte de mais de 250 pessoas, forçando a última unidade que ainda restava do império português a se integrar ao novo país, agora Brasil. As classes mais abastadas da época não queriam perder a linha de comunicação direta com a metrópole portuguesa, que era mais forte no Pará, principalmente por sua proximidade geográfica, de onde por exemplo, partiam as drogas do sertão sem passar pela gerência do governo central de Dom Pedro I, o que o incomodava”, explicou o diretor do Museu do Estado do Pará (MEP), Sérgio Melo.
Cabanagem
Registros históricos mostram, ainda, que o 15 de agosto de 1823 por si só, não trouxe muitas mudanças ou melhorias para a população mais pobre da época. Negros, caboclos, tapuios (indígenas), continuavam sendo oprimidos pelos governantes, mas foram os responsáveis, 10 anos mais tarde, por liderar o movimento da Cabanagem, importante luta popular. “Foi a partir de então que iniciou uma resistência heroica do povo paraense às condições de vida extremamente desiguais da época, dando início a fatos históricos que aconteceriam em um futuro, como por exemplo, a abolição da escravatura e a revolta da Cabanagem, única no Brasil que levou o povo ao poder”, complementou Sérgio.
A professora de história Mara Silva, da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Albaniza de Oliveira Lima, especialista em história da Amazônia, afirma que a Adesão do Pará à Independência é um assunto que desperta muito interesse nos estudantes. “Ao perguntar a eles se sabem o porquê deste feriado do dia 15 de agosto, eles respondem sobre a independência, mas não têm a real noção do que de fato aconteceu lá em 1823. Nessas aulas, além de descobrirem o grande conflito que ocorreu, aprendem a dissolver alguns preconceitos, como por exemplo, com o índio, com os escravos e com a própria descendência. Essas aulas também permitem que eles conheçam melhor a história e tenham orgulho do povo que construiu a sociedade paraense”, avalia.
Sobre o tema, Sérgio Melo complementa. “Quando alguém chega para mim e diz ‘eu sou branco’, respondo: tu nunca fostes branco nessa vida. A matriz brasileira foi índio, português e escravo. Quando os portugueses chegaram já não eram puros, por conta da invasão à península ibérica, que promoveu o cruzamento de vários povos, por isso aqui não tem branco, todos somos um pouco índios, um pouco negros e um pouco portugueses”, finalizou.
O Museu do Estado do Pará (MEP) fica localizado na Praça Dom Pedro II, s/nº, no bairro da Cidade Velha. A visitação é aberta de terça a domingo, incluindo feriados. Nos dias de semana esse passeio pela história pode ser feito de 10h às 15h. Aos sábados, domingos e feriados, de 9h às 13h. A entrada custa R$ 4, com meia-entrada. O MEP, obra do século XVIII do arquiteto Antônio Landi, oferece também diversos serviços, como exposições temporárias, realizadas nas galerias Antônio Parreiras e Manoel Pastana; exposição de longa duração, nos salões nobres; onde estão mobiliárias, esculturas, quadros acadêmicos e objetos utilitários do período Art Nouveau.