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Rigor na coleta do sangue aumenta a segurança transfusional

Por Redação - Agência PA (SECOM)
03/01/2018 00h00

Aos 21 anos, Seije Matheus estuda e faz planos como qualquer outro jovem de sua idade. Mas um detalhe o torna diferente dos demais: toda semana ele precisa fazer transfusão na Fundação Centro de Hemoterapia e Hematologia do Pará (Hemopa), em Belém. Há dois anos, Seije foi diagnosticado com aplasia medular, condição rara em que o organismo deixa de produzir quantidade suficiente de células sanguíneas novas. “Meu remédio depende da solidariedade das pessoas. Minha vida depende disso. É preciso esclarecer dúvidas e tabus para que mais pessoas doem sangue”, ressalta o jovem.

Todos os meses, cerca de oito mil bolsas de sangue são coletadas no Pará para ajudar pacientes de todas as idades e nas mais diversas situações. Alguns sofreram acidentes, outros fazem tratamento contra algum tipo de câncer ou têm alguma doença hematológica, como é o caso de Seije. O fundamental, em todos os casos, é garantir a qualidade do sangue. É a chamada segurança transfusional.

O coordenador de Hemoterapia do Hemopa, Carlos Victor Cunha, explica que, como qualquer procedimento hospitalar, uma transfusão possui riscos e cabe ao médico indicar o procedimento correto. O trabalho da Fundação em garantir a segurança transfusional é aplicado em duas vertentes: a triagem clínica e a sorologia. Esta consiste nos “exames de triagem laboratorial realizados nas amostras de sangue de doadores que verificam se o sangue doado pode ser utilizado para a transfusão”.

Quando um dos exames dá um resultado alterado, o sangue é automaticamente bloqueado pelo sistema informatizado que gerencia o ciclo do sangue para ser, então, descartado, seguindo as normas sanitárias vigentes. Segundo o coordenador, uma carta é enviada ao doador “convocando-o para que retorne ao Hemopa e faça nova coleta de amostra de sangue para repetição dos exames alterados. Caso a alteração se mantenha, o doador fica inapto definitivamente para uma nova doação. Ele recebe orientações e é encaminhado para um serviço de saúde onde realizará exames confirmatórios, acompanhamento e tratamento, se necessário”.

Carlos Victor chama atenção que os exames laboratoriais realizados pelo Hemopa, por se tratarem de exames de triagem, não possuírem a finalidade de estabelecer o diagnóstico de doenças. “Nesse sentido, o hemocentro está sempre em busca de ofertar serviços laboratoriais de triagem de excelência, de acordo com as normas mais exigentes para bancos de sangue”.

Além disso, existe a “janela imunológica”, que é o tempo transcorrido entre a contaminação e aparecimento de anticorpos que permitem a detecção de doenças no sangue. Dependendo da enfermidade, esse período pode chegar a um ano. Ou seja, nesse tempo, mesmo que o indivíduo esteja contaminado, a doença não vai aparecer nos testes. Por isso, outras medidas são tomadas para garantir a segurança do sangue.

A importância da triagem

Quando um voluntário chega ao Hemopa para doar sangue, existe uma rotina a ser seguida. O ciclo do sangue começa na recepção, onde o candidato apresenta documento de identificação oficial original e com foto. Se for a primeira doação, é feito seu cadastro. Caso já seja doador de sangue, suas informações pessoais são confirmadas e/ou atualizadas. Depois vem a pré-triagem, com a verificação do peso, pressão arterial, temperatura e nível de hemoglobina no sangue.

O passo seguinte é a triagem, a outra vertente da segurança transfusional. “A triagem clínica-epidemiológica é uma entrevista que avalia, com dados fornecidos pelo candidato, riscos potenciais que a doção pode representar tanto para a saúde do doador quanto do receptor de sangue, podendo ter como resultado uma inaptidão temporária ou definitiva para a doação, seguindo critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e recomendações de estudos científicos nacionais e internacionais”, detalha Carlos Victor.

Há mais de 15 anos na triagem do Hemopa, a médica Socorro Ferreira conta que toda a legislação do sangue determina o que deve ser perguntado durante a triagem, possibilitando ao profissional adentrar na intimidade do doador para investigar a vida sexual e social dele. “Vamos perguntar, por exemplo, se a pessoa tem múltiplos parceiros. Se positivo, isso leva a inaptidão. Porque, segundo a legislação, essa pessoa tem uma exposição maior às doenças sexualmente transmissíveis”.

Esses questionamentos abrangem diversas situações, umas voltadas à proteção do doador, outras protegem os pacientes. “O uso de determinados medicamentos impossibilita a doação porque as substâncias são veiculadas pelo sangue afetando quem irá receber a transfusão. Já o doador que está com algum problema de saúde, como uma infecção, por exemplo, também não poderá doar. Essa é uma medida de proteção ao voluntário”, comenta Socorro.

A médica observa que toda transfusão parte da premissa de que o voluntário vai ao hemocentro para salvar uma vida e não para contribuir para o agravamento da saúde de alguém que já está tão debilitado. “Eu sempre digo que eu trio pensando que as minhas filhas que vão receber esse sangue. Gosto de fazer triagem. Nós criamos laços com as pessoas, ouvimos histórias. O contato é direto com o doador. Algumas vezes um candidato que nunca doou chega desesperado porque alguém da família está precisando. Ele acaba não podendo doar porque a pressão está alterada ou porque não tem condições emocionais para isso. Então precisamos conversar com ele, acalmá-lo. É um trabalho muito humanizado”, fala.

O profissional da triagem pode ser um médico ou qualquer outra pessoa da área da saúde de nível superior, desde que seja capacitado e qualificado para desempenhar a função e que esteja sob a supervisão de um médico.

A médica comenta que muitas pessoas têm medo de ir a uma unidade de saúde e relatar a suspeita de contaminação por alguma doença. “Infelizmente, essas pessoas acham que o caminho mais fácil é vir ao Hemopa. Mas nós percebemos isso. Nosso objetivo é garantir a segurança de quem vai receber o sangue”.

Assim como há constante sofisticação tecnológica na sorologia, também existe uma evolução na legislação do sangue. Isso é causado pela série de estudos e entendimentos que permitem a inclusão de critérios, como também a exclusão de outros. “Costumo dizer que não existem doadores. Existe o doador. Não existem pacientes. Existe o paciente. Cada caso é um caso e a lei acompanha tudo isso”, comenta Socorro.

Um exemplo disso é o exame de endoscopia. Antes, não havia vedação à doação para quem fazia o procedimento. Mas agora é diferente. “Para as pessoas que fazem endoscopia, se dá um período de seis meses porque existem estudos que comprovaram que, mesmo minimamente, há risco de se contrair hepatite C durante o exame”.

Caso o candidato à doação seja aprovado na triagem, ele segue para dar seu voto de autoexclusão. A pergunta feita por uma máquina é “você está seguro que seu sangue pode ser usado em pacientes”. O candidato deve responder “sim” ou “não”. Esse voto é fundamental para maior segurança daquele que recebe a transfusão, caso o candidato tenha omitido alguma informação durante a entrevista. Se a resposta for negativa, a bolsa de sangue a ser coletada será automaticamente descartada.

Por fim, o doador é conduzido até a sala de coleta. O procedimento é seguro, já que o material utilizado é totalmente descartável. São coletados cerca de 450 ml de sangue, além de amostras para a realização dos exames.